TEDH, 4.ª S., Vyshnyakov c. Ucrânia, Acórdão de 24 de julho de 2018

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CEDH, Artigo 8.º, Não execução de uma sentença de regulação da guarda de uma criança. Violação.

Artigo 14 + 8.º Discriminação em razão do género invocada por o Requerente que sofreu com a inexecução da sentença, o pai, ser do género masculino. Não violação.


Vyshnyakov apresentou queixa contra a Ucrânia em 2012 pela não execução de uma sentença do tribunal interno que lhe concedeu acesso à sua filha menor. Outro processo em que se procurou opor à mudança de domicílio pela mãe, tendo este pedido sido rejeitado, fundamentou a sua queixa por discriminação de género, entendendo que a fixação de domicílio da criança, então pedida, fora rejeitada por ser homem.

O casal casara em 2006, a sua filha nasceu em 2007. Pouco depois, os pais separaram-se, em 2009 obtiveram o divórcio. Nesta decisão o Tribunal de Mykolayiv concedeu ao pai o direito de visitas. A mãe sempre se opôs, vindo entretanto a mudar-se com a filha para uma localidade distante de 600 quilómetros, o que motivou da parte de Vyshnyakov um novo processo em que este pediu que o domicílio da filha viesse a ser o do pai, o que o tribunal rejeitou.

Entretanto Vyshnyakov propôs uma ação de execução de sentença, a sentença que atribuía a ambos os progenitores um direito de contato e de convivência com a criança, mas, apesar de uma decisão favorável à execução, da parte da primeira instância, esta decisão acabou em recurso por ser revogada por inexistir um quadro regulatório processual bastante para suportar uma ação executiva desta natureza. Vyshniakov voltou a insistir junto do tribunal e obteve a comparência de agentes de execução, que se limitaram a ler à mãe a sentença de regulação da guarda parental, e entenderam satisfeita a ação executiva. Vyshnyakov, inconformado, voltou a propor uma ação executiva mas o tribunal entendeu estar correto o comportamento dos agentes de execução e rejeitou esta ação por improcedente.

O Requerente queixou-se à luz dos artigos 6.º e 13.º da iniquidade do processo, queixou-se, à luz dos artigos 14.º e 8.º, de discriminação de género, pediu compensações à luz do artigo 41.º e pediu que o TEDH se pronunciasse em matéria de execução de acórdãos (do próprio TEDH), ao abrigo do art.º 46.º da CEDH.

O TEDH considerou a queixa admissível e requalificou a queixa à luz dos artigos 6.º e 13.º combinados, como relevando do artigo 8.º. Neste ponto, o TEDH entendeu que o gozo pelos pais e pelos filhos da presença mútua, é um elemento essencial da vida familiar para o efeito do artigo 8.º da CEDH. É dever do Estado permitir este relacionamento e evitar que alguém o possa prejudicar. O queixoso mostrou às autoridades nacionais o prejuízo sério no relacionamento com a filha, que estava a ser provocado. O TEDH não concordou com a visão das autoridades, de que o processo executivo estaria encerrado com a simples leitura da sentença de distribuição da guarda parental à mãe. Tal não foi bastante para assegurar a execução desta sentença.  Nomeadamente, a ausência de medidas de coação impostas à mãe diminuiu a cooperação desta. Por seu turno, a inexistência de um quadro regulatório preciso ajudou ao incumprimento da decisão judicial. Houve assim, a violação do artigo 8.º § 1 da CEDH.

Quanto à violação alegada do princípio da não discriminação de género associada ao direito à vida privada e familiar, o TEDH requalificou-a sob o ângulo exclusivo do art.º 8.º. E entendeu que por ser a criança pequena e habituada a viver com a mãe, não houve violação deste preceito na recusa pelo tribunal em atribuir o domicílio da criança ao pai, como este pedira.

Em sede do art.º 46.º o TEDH entendeu que a execução do seu Acórdão estaria cumprida com a supervisão pelo CM do cumprimento deste Acórdão pelas autoridades nacionais. Por fim atribuiu ao pai uma indemnização pelo dano moral, bem como um montante ao título das custas e despesas que o processo de queixa junto do TEDH causou ao Requerente. O Acórdão foi votado por unanimidade.


Autor: Paulo Marrecas Ferreira

Fonte: Tribunal Europeu dos Direitos Humanos